SE É A MERA CURIOSIDADE QUE AQUI TE CONDUZ, DESISTE E VOLTA; SE PERSISTIRES EM CONHECER O MISTÉRIO DA EXISTÊNCIA, FAZ O TEU TESTAMENTO E DESPEDE-TE DO MUNDO DOS VIVOS.

sexta-feira, 19 de fevereiro de 2010

A INICIAÇÃO


Não dormes sob os ciprestes,
Pois não há sono no mundo.
O corpo é a sombra das vestes
Que encobrem teu ser profundo.
Vem a noite, que é a morte,
E a sombra acabou sem ser.
Vais na noite só recorte,
Igual a ti sem querer.
Mas na Estalagem do Assombro
Tiram-te os Anjos a capa.
Segues sem capa no ombro,
Com o pouco que te tapa.
Então Arcanjos da Estrada
Despem-te e deixam-te nu.
Não tens vestes, não tens nada:
Tens só teu corpo, que és tu.
Por fim, na funda caverna,
Os Deuses despem-te mais.
Teu corpo cessa, alma externa,
Mas vês que são teus iguais.
A sombra das tuas vestes
Ficou entre nós na Sorte.
Não estás morto, entre ciprestes.
Neófito, não há morte.
Fernando Pessoa
A Iniciação nos Mistérios supõe uma completa transmutação que terá de se operar gradualmente no adepto, em diversos níveis, durante o caminho para o conhecimento de si mesmo; é uma via gradual na qual se conhecerão, pouco a pouco, os distintos estados do ser.



O termo “iniciação”, derivado do latim initium, significa “começo” e também “entrada”. Por um lado, supõe o início de um processo de conhecimento da realidade Metafísica e, por outro, o ingresso num caminho verdadeiramente espiritual que terá de conduzir a uma real “deificação” daquele que o possa empreender e continuá-lo até o fim.

O iniciado deverá morrer para o mundo profano e ilusório e perder a falsa identidade com seus aspectos puramente individuais, passageiros e mortais, e simultaneamente ressuscitará para um mundo sagrado e verdadeiro que lhe identificará melhor com o real e imutável, com aquela essência pura e imortal que constitui seu verdadeiro Ser. Este percurso supõe uma viagem interior, e irá acompanhado do conhecimento de outros mundos que estão aqui e agora, mas que a mente ordinária nem sequer pode imaginar.
Para que a Iniciação ocorra, será necessário que o adepto permita que os símbolos e ritos sagrados, proporcionados pela doutrina da Tradição Unânime, penetrem em seu interior e operem essa transformação integral, que terá que se produzir quando estes instrumentos despertadores da consciência ordenem a inteligência e toquem as fibras mais sutis e imperceptíveis que se conectam com as verdades eternas. Ela comporta um desenrolar de potencialidades ocultas e misteriosas, que jazem em nossa própria interioridade, e um desenvolvimento das possibilidades verdadeiramente espirituais, que no estado ordinário se encontram adormecidas. O estudo dos códigos simbólicos tradicionais –como aqueles que são proporcionados por nosso Programa–, bem como a meditação e a concentração –e a prática dos rituais iniciáticos–, serão veículos adequados para que esta transmutação e despertar da consciência sejam produzidos e se substituam progressivamente os apegos e as falsas identificações por aquilo que se denomina a Suprema Identidade.
Este processo, simbolizado claramente pela transmutação dos metais que propõe a Alquimia, bem como pelas diversas etapas contempladas no simbolismo construtivo, supõe duas fases: a primeira delas é chamada iniciação virtual e vai desde o começo da Obra até a consecução do estado de “homem verdadeiro”, passando por diversos graus que suporão a superação de provas que terão de determinar se o candidato está qualificado; a segunda –chamada Iniciação real ou efetiva– supõe o conhecimento e a experimentação de estados supra-humanos e atingir o estado de “homem transcendente”.
O candidato à Iniciação é como uma semente que, contendo todas as possibilidades de desenvolvimento e procriação, não as poderá plasmar enquanto não penetrar o interior da terra –a caverna iniciática–, descendo aos infernos e morrer, para nascer de novo. É por isso que o recém iniciado é chamado “neófito”, ou planta nova (neo = nova; fito = planta), pois já venceu a primeira morte e está pronto para empreender seu desenvolvimento vertical e ascendente.
Esta morte comporta uma completa dissolução dos estados anteriores, que deverá ser repetida cíclica e gradualmente –em diversos níveis cada vez mais sutis e elevados– durante o curso do processo iniciático, até que renasça o homem novo, o homem verdadeiro, totalmente regenerado, que terá desenvolvido o leque de suas possibilidades humanas e estará pronto para transcender aos estados supra-individuais e recobrar seu verdadeiro Ser. Terá assim retornado ao estado virginal das origens, à pátria celeste.
Não queremos terminar sem dizer algo muito importante para se ter em conta no processo iniciático ou de conhecimento: o de não confundir o plano psicológico com o espiritual, erro que é muito freqüente hoje em dia. Isto acontece porque o espiritual foi negado ao se fazer uma diferença cortante entre alma e corpo, outorgando-se-lhe então a tudo o que não é material, ou corporal, uma categoria espiritual, ou pseudo-espiritual.


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